Relator excluiu possibilidade de registro automático para agrotóxicos autorizados pela OCDE. Projeto segue para a sanção do presidente Lula.
Por Kevin Lima, Beatriz Borges, Vinícius Cassela, g1 — Brasília
O Senado aprovou nesta terça-feira (28) o projeto que regulamenta e acelera o processo de registro de agrotóxicos no Brasil.
O texto seguirá para a sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O projeto já havia sido aprovado pelo Senado, mas voltou à análise dos senadores porque foi alterado pela Câmara.
Relator da proposta, o senador Fabiano Contarato (PT-ES) construiu um "meio-termo" entre o pleito do agro e os desejos de setores mais progressistas do governo Lula.
A costura com membros da bancada do agronegócio levou à rejeição de uma série de mudanças realizadas pelos deputados (veja mais abaixo), entre as quais um dispositivo que permitia a autorização temporária automática para novos agrotóxicos, que já são permitidos por países-membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
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Segundo a proposta aprovada, os processos de concessão e reavaliação de registros desses produtos deverão seguir prazos. O projeto também estabelece uma taxa do procedimento de avaliação, que será definida posteriormente.
O texto define que agrotóxicos e produtos semelhantes de controle ambiental somente poderão ser pesquisados, produzidos, exportados, importados, comercializados e utilizados se previamente autorizados ou registrados em órgão federal.
Pelo projeto, o Ministério da Agricultura será responsável pelo registro de agrotóxicos. Caberá ao Ministério do Meio Ambiente coordenar o registro de produtos de controle ambiental. O Ministério da Saúde ficará responsável por apoiar tecnicamente os procedimentos.
A participação dos órgãos no processo foi a principal mudança de Contarato na proposta aprovada pela Câmara. O texto, que ganhou aval dos deputados em fevereiro, possibilitava a centralização do processo de registro de agrotóxicos no Ministério da Agricultura e transformava os órgãos vinculados ao Meio Ambiente e à Saúde como consultivos.
Os processos de registro para utilização e comércio no Brasil deverão seguir critérios estabelecidos pelo Acordo sobre a Aplicação de Medidas Sanitárias e Fitossanitárias (SPS), pelo GHS (Sistema Globalmente Harmonizado) e pelo Codex Alimentarius.
Será obrigatória a avaliação dos riscos dos produtos. Esse estudo deverá levar em consideração fatores econômicos, sociais e os efeitos da utilização desses produtos na saúde humana e no meio ambiente.
Agrotóxicos e produtos de controle ambiental que forem classificados com risco “inaceitável” ao meio ambiente e aos seres humanos serão impedidos de obter o registro.
O processo de registro de produtos novos deverá ser concluído em até 24 meses. Agrotóxicos com fórmulas idênticas a outros já aprovados terão prazo reduzido de 60 dias.
Atualmente, segundo setores do agronegócio, um produto pode levar até cinco anos para conquistar o registro para uso e comercialização no Brasil.
Também será possível solicitar um registro temporário, que deverá ter análise concluída em até 30 dias.
A regulamentação do procedimento será feita posteriormente pelo governo federal. De acordo com a proposta, ao regulamentar a lei, o governo deverá buscar a “simplificação e a desburocratização de procedimentos e a redução de custos e do tempo necessário para a conclusão das análises dos processos de registro”.
Revalidação do registro
O texto estabelece que o registro de um agrotóxico poderá ser reavaliado se organizações internacionais responsáveis de saúde, alimentação e meio ambiente desaconselharem o uso.
A reanálise será feita pelos órgãos da agricultura e do meio ambiente. O processo deverá considerar riscos dos aspectos econômicos e fitossanitários, e a possibilidade de uso de produtos substitutos.
umTodo o processo de reavaliação deverá ser concluído em até um ano e seis meses. Ao término da análise, poderá ser decidida a:
- manutenção do registro sem alterações;
- manutenção do registro, mediante adequação;
- mudança da formulação, da dose ou do uso;
- restrição da comercialização;
- proibição, suspensão ou restrição da produção ou importação;
- proibição, suspensão ou restrição do uso;
- e cancelamento ou suspensão do registro.
Agrotóxicos produzidos para exportação não precisarão de registro.
Contarato rejeitou mudanças aprovadas pela Câmara dos Deputados que criavam uma autorização temporária para novos agrotóxicos que tivessem registro em, no mínimo, três países-membros da OCDE.
O senador também excluiu a concessão automática de registro temporário nos casos em que os órgãos responsáveis pelo registro não tiverem concluído o processo no prazo estabelecido.
Venda dos produtos
Pelo texto, agrotóxicos e produtos de controle ambiental poderão ser vendidos diretamente aos usuários, a partir de uma receita agronômica emitida por profissional habilitado.
Empresas titulares dos registros dos produtos deverão encaminhar, até 31 de janeiro de cada ano, dados dos produtos comercializados e produzidos.
Além disso, a proposta estabelece ainda regras para as embalagens dos agrotóxicos. Em linhas gerais, para serem vendidos ou expostos, esses produtos deverão exibir rótulos próprios e bulas em português com, entre outras coisas, instruções para utilização.
Fiscalização
Segundo a proposta, a inspeção e o processo de fiscalização dos agrotóxicos serão definidas em regulamentação posterior do governo federal.
Estados, Distrito Federal e municípios também poderão participar da fiscalização, que poderá contar com o apoio de órgãos do governo federal.
Punições
O projeto aprovado também prevê punições para danos ambientais e a terceiros. Os responsáveis poderão ter de arcar, de forma solidária, com indenização ou reparação integral desses danos.
A responsabilização poderá ser aplicada ao:
- profissional que receitar produto de forma equivocada ou imprudente;
- usuário ou ao prestador de serviços que utilizar o agrotóxico de forma diversa da prevista pela receita ou pelo fabricante;
- comerciante que vender produtos sem receita;
- órgão responsável pelo registro;
- agricultor;
- empregador.
O projeto também estabelece que as empresas poderão ser punidas administrativamente pelo comércio, transporte, produção e aplicação de agrotóxicos que descumprirem as regras.
Quem produzir, armazenar, transportar, importar, utilizar ou comercializar agrotóxicos não registrados ou não autorizados poderá ser condenado à prisão de até 9 anos, além do pagamento de multa. A pena poderá ser aumentada se houver dano à propriedade alheia, ao meio ambiente ou a alguma pessoa.
A produção, importação, comercialização e destinação indevida de resíduos de agrotóxicos poderá ser punida com até 4 anos de prisão.
Críticas de ambientalistas
A proposta aprovada pelo Senado é criticada por ambientalistas, que apelidam o texto de “PL do Veneno”.
Na última semana, a Campanha Permanente contra Agrotóxicos disse não enxergar motivos técnico-científicos que justifiquem o projeto.
O grupo afirmou que “considera o projeto como um todo prejudicial”, mas destacou como prejudiciais a “imposição de prazos rápidos para registros e reanálise de agrotóxicos” e a “omissão em relação à propaganda de agrotóxicos”.
O Grupo de Trabalho Agrotóxicos e Saúde da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) disse reconhecer “alguns avanços” no relatório apresentado por Fabiano Contarato. Afirmou, porém, que o texto “promoverá danos irreparáveis aos processos de registro, monitoramento e controle de riscos e dos perigos dos agrotóxicos no Brasil, responsáveis por graves danos à saúde humana e ao ambiente”.
Em seu relatório, Contarato afirmou que o projeto "atende a uma necessidade de atualização normativa diante do desenvolvimento técnico e científico do mundo atual."
Uma das negociadoras do texto no Senado, a senadora Tereza Cristina (PP-MS), integrante da bancada do agronegócio, classificou o projeto como "importante" para o país.
"É um dia para nós de virada de página. Depois de 24 anos, esse PL, tramitando entre Senado e Câmara, teremos oportunidade de aprová-lo através de um texto que foi construído por consenso. [...] Importante para o Brasil. Não só para agricultura, mas também para os consumidores brasileiros", disse.
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