Ainda é cedo, mas efeitos ainda podem desencadear uma alta nos preços de combustíveis — e da inflação como um todo.
Por Bruna Miato, g1
Bomba de gasolina em posto de combustíveis de Macapá — Foto: Jorge Júnior/Rede Amazônica
Além da questão humanitária e geopolítica, a ameaça de espalhamento do conflito no Oriente Médio no fim de semana mexeu também com o mercado financeiro nesta segunda-feira (15). A guerra que começou na Faixa de Gaza, entre Israel e o grupo terrorista Hamas, tem agora uma participação mais evidente do Irã.
A rivalidade entre os países é antiga, mas o conflito esquentou porque Israel acusa o Irã de ser um dos financiadores do Hamas.
No fim de semana, o governo iraniano lançou mísseis e drones contra o território de Israel, em resposta a um bombardeio no dia 1º de abril contra o consulado iraniano em Damasco, na Síria, em que um comandante sênior das Guardas Revolucionárias do Irã foi morto. E esse foi o primeiro ataque iraniano direto contra Israel na história.
A primeira reação do mercado veio cedo: o dólar disparou desde a manhã desta segunda, chegando à casa dos R$ 5,21, enquanto a bolsa de valores brasileira teve queda. Em momentos de tensão, os investidores "correm" para ativos mais seguros (como ouro e títulos dos Estados Unidos), prejudicando mercados emergentes como o nosso.
Mas uma expansão do conflito teria consequências além do câmbio e bolsa por aqui.
Cabe destacar:
- ⛽ uma possível alta no preço do petróleo, que pode levar a um aumento nos preços dos combustíveis;
- 💸 a disparada do dólar pode impactar a inflação, sobretudo dos produtos importados;
- 📈 os juros podem cair menos que o esperado.
O Irã deu o assunto por encerrado e classificou o ataque como legítima defesa. O governo israelense, contudo, afirma que pretende revidar. O g1 explica nesta reportagem quais fatores já trazem problemas para a economia brasileira e quais ainda serão analisados nos próximos dias.
Alta do petróleo e preço dos combustíveis
O principal impacto esperado pelos especialistas ouvidos pelo g1 era uma alta do preço do petróleo, tendo em vista que a região do Oriente Médio é uma grande exportadora da commodity.
Na sexta-feira (12), com o aviso do Irã de que lançaria o ataque contra Israel, o preço do barril do petróleo subiu e encerrou o dia cotado a mais de US$ 90. Mas, nesta segunda-feira, o preço não decolou.
É verdade que os preços já subiram bastante no ano passado, desde o início da guerra entre Israel e Hamas. Mas esse reforço é uma preocupação primordial por aqui porque acrescenta pressão à política de preços da Petrobras.
Um aumento do preço do petróleo deveria afetar diretamente os valores de combustíveis no Brasil, mas a empresa tem segurado os reajustes desde a mudança da política de preços em maio do ano passado.
"Hoje, o preço dos combustíveis no Brasil já possui uma defasagem próximo de 17% em relação aos preços internacionais. Se o conflito no Oriente Médio escalar, o barril do petróleo pode bater facilmente US$ 100, o que pressionaria a Petrobras a fazer um reajuste", comenta Felipe Vasconcellos, sócio da Equus Capital.
Apesar disso, segundo apuração do blog do Valdo Cruz, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), considera que a empresa não deveria reagir imediatamente ao aumento da tensão nos mercados por causa da entrada direta do Irã no conflito no Oriente Médio.
Disparada do dólar
Além de mexer com o preço do petróleo, o ambiente de incertezas geopolíticas também impacta na cotação do dólar, que é considerada a moeda mais segura do mundo.
Felipe Vasconcellos, da Equus Capital, explica que, em momentos assim, acontece um movimento comum no mercado financeiro, conhecido como "flight to quality" (ou "voo para a qualidade", na tradução do inglês).
"Em períodos de forte turbulência global, o dinheiro migra para a economia mais segura do mundo, no caso, a americana. Isso faz com que o dólar se valorize sobre todas as moedas, inclusive o real, que é uma economia emergente e com maior risco, pelo ponto de vista do investidor", afirma.
A economista Ariane Benedito destaca ainda que o sentimento de aversão aos riscos é mais intenso no Brasil em razão das últimas notícias sobre as contas públicas.
Nesta segunda-feira, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, confirmou em entrevista ao programa Estúdio i, da GloboNews, que o governo reduziu a meta fiscal de 2025 para um novo déficit zero para as contas públicas.
Para 2026, o governo passa a prever um superávit de 0,25%, e de 0,5% em 2027, até chegar a 1% em 2028.
Além das novas metas, o salário mínimo deve ser de R$ 1.502 no próximo ano, e ambas as propostas estão no projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2025.
Em outras palavras, isso significa mais tempo para um equilíbrio da dívida pública. A confirmação dos planos de Haddad reforçou a alta do dólar ainda durante entrevista do ministro ao Estúdio i.
Pressão inflacionária e juros caindo menos
A equação de fortalecimento do dólar com pressão sobre os preços de combustíveis é perigosa para a inflação.
Sempre que grandes potências do mundo petrolífero se envolvem em questões diplomáticas, as commodities — em especial, o petróleo — ficam mais voláteis no mercado internacional. Uma nova complicação na oferta pode acionar mais um gatilho para que os preços de combustíveis subam em todo o mundo.
E sempre que há aumento do preço dos combustíveis, começa um efeito em cadeia de repasse de preços para outros setores, como os serviços e indústria alimentícia. Além disso, produtos importados também refletiriam o valor da moeda americana.
"Teríamos um impacto direto em todos os produtos importados e commodities, como o agronegócio por exemplo", diz Felipe Vasconcellos, da Equus Capital.
"Por um lado, a agricultura e a pecuária seriam beneficiados diretamente, assim com as empresas brasileiras exportadoras. Entretanto, diversos outros produtos, que dependem de insumos importados — desde o trigo que vai no pão, até os medicamentos — teriam um reajuste de preço, pois o custo de produção aumentaria."
Sérgio Goldenstein, estrategista-chefe da Warren Investimentos, destaca que, caso a tendência de aumento de preços se confirme, haveria chance de prejudicar o ciclo de corte nos juros no Brasil.
Os juros são usados, principalmente, como forma de controlar a inflação. Uma disparada nos preços poderia dificultar o caminho do BC na redução das taxas.
Já em sua última reunião, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central do Brasil (BC) optou por cortar a taxa básica de juros (Selic) pela sexta vez, para 10,75% ao ano, mas prometeu apenas mais um corte de 0,5 ponto percentual, deixando em aberto os próximos passos.
"Apesar de mediana das expectativas dos economistas para a taxa Selic terminal ser de 9%, o mercado de juros futuros já precifica uma Selic final na casa de 10%", comenta Goldenstein.
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